sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

CASAMENTO GAY EM PORTUGAL

Falha na lei:
Casais de lésbicas podem recorrer à inseminação
por Ana Sá Lopes,
Publicado em 08 de Janeiro de 2010 Actualizado há 3 horas
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Lei do PS cheia de buracos: gays podem adoptar sozinhos mas não quando estão casados
Francisco Assis queria dar liberdade de voto; Sócrates travou-o
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Filipe Casaca
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A lei do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, que é hoje aprovada na Assembleia da República, deixa um casal de lésbicas recorrer à inseminação artificial, mas proíbe-as expressamente de adoptar. O PS insistiu em arranjar uma alínea para impedir a adopção, o que torna o regime de parentalidade reservado aos gay, na ordem jurídica, absolutamente desconexo: podem adoptar se forem solteiros, não podem adoptar casados; um casal de lésbicas pode recorrer à inseminação artificial, duas mulheres em união de facto estão proibidas de o fazer.
É verdade que a lei da procriação medicamente assistida faz discriminação no caso da união de facto - só aceita que recorram à PMA "unidos de facto" que sejam de sexo diferente -, mas o PS, até ver, não decidiu estender essa discriminação ao regime do casamento. Assim, com a lei em vigor, "as pessoas casadas que não se encontrem separadas judicialmente de pessoas e bens ou separadas de facto" podem aceder à procriação medicamente assistida.
Sobre o diploma hoje aprovado paira o risco da inconstitucionalidade, argumento comum ao Bloco de Esquerda e aos movimentos anticasamento gay. Os dois lados não têm dúvidas de que vedar o direito à adopção em função da orientação sexual do casais não passa no crivo do Tribunal Constitucional.
A nuvem que ensombra o debate sobre o casamento civil e a polémica no PS por causa da liberdade de voto não impede que Miguel Vale de Almeida, o primeiro activista gay eleito deputado, considere que "o dia de hoje é de uma importância política tremenda", porque a partir de agora os direitos dos gays e lésbicas "nunca mais sairão da agenda política": "Significa uma transformação no quadro de referência da política e da democracia em Portugal. É como se a partir daqui não se pudesse voltar atrás", disse Miguel Vale de Almeida ao i. Embora fosse defensor da liberdade de voto relativamente aos projectos do Bloco e dos Verdes que abrem portas à adopção, o deputado afirma "compreender a razão" da disciplina de voto imposta por Sócrates ao líder parlamentar, Francisco Assis.
As excepções são mínimas: Sérgio Sousa Pinto, ex-líder da JS; Duarte Cordeiro, actual líder da JS; e três independentes, o próprio Miguel Vale de Almeida, Inês Medeiros e João Galamba, que só estão obrigados à disciplina de voto em Orçamentos de Estado e moções de censura ou confiança. Outras excepções, mas no voto contra o casamento e a adopção são Maria do Rosário Carneiro e Teresa Venda, eleitas pelo movimento Humanismo e Democracia. Jamila Madeira, que foi dirigente da JS, requereu liberdade de voto, mas estava em dúvida à hora de fecho desta edição.
A reunião de quinta-feira à noite da bancada do PS foi acesa. Francisco Assis, defensor da liberdade de voto relativamente aos projectos que admitem a adopção, teve que explicar a sua derrota frente à intransigência de Sócrates na disciplina de voto - intransigência essa que tinha o apoio de vários vice-presidentes do próprio Assis. Coube a Ricardo Rodrigues a defesa convicta da disciplina de voto: manifestou-se a favor da adopção, mas disse que o que estava em causa era um "compromisso político" que o PS tinha que honrar. A quem levantou a questão de estar ali matéria de consciência, respondeu que direitos dos cidadãos não são matéria de consciência.

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