sexta-feira, 20 de novembro de 2009

LISBOA: TORRE DA IGREJA DE SÃO FRANCISCO XAVIER

Troufa Real argumenta que tudo foi devidamente discutido DANIEL ROCHA
Troufa Real responde às críticas com nova proposta de torre

Por Ana Henriques

Autor do polémico projecto da igreja do Restelo inspira-se em Hieronimus Bosch. E chama "talibãs da arquitectura" aos detractores

O arquitecto Troufa Real vai inspirar-se na obra do pintor Hieronimus Bosch para redesenhar a torre da polémica igreja que projectou para o Restelo, em Lisboa, e que começou esta semana a ser construída.
Troufa Real assegura, em declarações ao PÚBLICO, que esta alteração não se prende com nenhum pedido que lhe tenha sido feito para modificar o seu projecto inicial, mas sim com o facto de já não se rever na torre de tipo manuelino que desenhou, há diversos anos, para aquele espaço. "Já vou na quinta torre" para a Igreja de S. Francisco Xavier, explica o arquitecto, acrescentando que uma das versões previa uma torre com vitrais.
Desta vez a fonte de inspiração será "o quadro As Tentações de Santo Antão" - uma obra do séc. XVI de Bosch - "e José Saramago". Inicialmente concebida para ter cem metros de altura, a nova torre será mais baixa ou mantém as mesmas dimensões? "Não sei", responde Troufa Real. "Gosto muito de tudo o que é alto. Lisboa ficou a perder por não se terem construído as torres de Siza Vieira em Alcântara. Seja como for, não há pressa, uma vez que a construção desta parte da igreja será feita mais tarde."
Quanto ao resto do projecto, o arquitecto insiste em mantê-lo tal como o criou. A nave da igreja, pintada em dourado do lado de fora, imita, pela sua forma, "uma caravela num temporal, toda dobrada". Depois, além da torre com 17 sinos, há a casa do pároco, "que é uma referência à casa portuguesa do arquitecto Raul Lino". E, por fim, o centro social, reservado para a segunda fase, "que será uma réplica das antigas fortalezas portuguesas da época dos descobrimentos". As paredes vermelhas, cor-de-laranja, verdes e brancas são uma referência à Índia (destino de viagem de S. Francisco Xavier) e a Portugal.
"A minha arquitectura está ligada ao mundo do fantástico, é de raiz simbólica. Não sou um arquitecto moderno, sou antimoderno", explica o autor do projecto, considerando que colegas seus, como Teotónio Pereira (que classificou, ontem, no PÚBLICO, este projecto uma "aberração"), não compreendem a sua linguagem. "Odeiam o simbolismo do antigo império. É um bando de velhos, autênticos talibãs da arquitectura que não se reciclaram e não percebem o que se está a passar no mundo", acusa. E volta à carga: "Odeiam outras culturas. Só sabem fazer peixe podre, peixe passado".
Direito à arquitectura
O arquitecto que dirige o departamento do patriarcado responsável pela construção das novas igrejas, Diogo Lino Pimentel, também não sai ileso desta polémica. Depois de ter dito que o edifício para o Restelo dava muito nas vistas, recebe agora a resposta de Troufa Real. "Ele quer é fazer as igrejas no atelier dele. Mas quando esta igreja foi objecto de apreciação na Ordem dos Arquitectos, no tempo da bastonária Olga Quintanilha [entre 1999-2001], ele também esteve lá e não disse nada".
Troufa Real argumenta que o projecto foi devidamente apresentado e discutido, há cerca de dez anos, tanto na Ordem como na Cordoaria, além de ter estado exposto numa galeria da Câmara de Lisboa.
Para Troufa Real, esta sua obra é nem mais nem menos que um "cadáver esquisito". Uma expressão que usa para definir um trabalho colectivo surrealista, lembrando que convidou diferentes artistas, como Lagoa Henriques - entretanto falecido - para participar neste projecto.
Esta não é a sua primeira obra religiosa. Tem em construção outra igreja em Miraflores, Oeiras, e projectou um templo dedicado a Shiva para Loures, obra que ainda não saiu do papel. "Sou um maçon católico e respeito muito os cânones da igreja", declara. A morar em Angola, terra onde nasceu, Troufa Real deixa um recado a todos os que criticam o seu trabalho: "Deixem-me ser livre. Tenho direito à minha arquitectura de autor".

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