CONFESSO que não estava à espera de me preocupar com o mono. Nas escarpas de Sagres, entre a travessa de robalo e o travo da amarguinha, uma pessoa até se esquece de Lisboa e da sujidade, dos monos, das petições e abaixo-assinados inúteis numa cidade entregue aos vigilantes da Emel, aos especuladores imobiliários e aos mil projectos de reabilitação de qualquer coisa, a Baixa, a Ribeirinha, o bairro da Liberdade, o que se quiser. Tenho a maior simpatia pelo Costa, como é conhecido o nosso presidente da Câmara, por causa da cidade miserável, débil e endividada que ele herdou da Câmara do PSD, mas, pela parte que me toca, a coisa está frouxa. Antes de rumar a sul recebi uma petição no computador, "Salvem o Largo do Rato". Confesso, todos os dias recebo petições inúteis, deixei passar. Pensei que se tratava de salvar o actual Largo do Rato, uma das praças amaldiçoadas de Lisboa, que serve de entreposto e escoamento de trânsito e que foi tão maltratada que se entenderia o desejo de salvar o Rato do Rato.
A sul, praia ao fundo, mostram-me um jornal com uma fotografia do mono, ou da maqueta do mono. E a notícia de que duas senhoras respeitáveis do PSD, de seus nomes Margarida Saavedra e Paula Teixeira da Cruz, estão muito incomodadas com o mono e pedem explicações ao actual presidente, o Costa, e ao Executivo municipal. Percebo, o que não é o mesmo que perceve, uma coisa que se come muito para estes lados, que o mono vai ser instalado algures entre o Palácio Palmela, a sinagoga de Lisboa e uma série de edifícios classificados, e que tem a assinatura dos arquitectos Valsassina e Aires Mateus, reputadíssimos. O mono é um monstro, parece uma prisão, é um monobloco brutal, totalmente desadequado no Largo do Rato, com uma altura calculada pela cércea da Alexandre Herculano e não da praça, o pobre Rato, e percebo que a petição era contra o monstro. Eu moro por ali e sou já contra o monstro, embora dois arquitectos reputados, Helena Roseta e Manuel Salgado, confessem uma certa simpatia pelo monstro. Não se ataca a corporação dos reputados arquitectos.
Faço uns telefonemas e pergunto, o mono vai mesmo ser aprovado? Segundo o jornal, o reputado "Público", só vão votar contra o mono o vereador Sá Fernandes e o PCP. O mono vai ser aprovado. E construído. Faço mais umas perguntas? Porquê? Porque há direitos adquiridos, expectativas dos construtores e promotores, e cancelar o mono significaria pagar indemnizações de milhões de euros que a Câmara não tem. Portanto, quando os moradores de Lisboa sabem de monos construídos na sua área de residência, sabem tarde demais e a conversa é esta: expectativas dos donos do projecto. Entre a Duarte Pacheco, as Amoreiras e a Artilharia Um, está prevista a construção de uma cidade dentro da cidade, outro mono monstruoso, com dezenas de milhares de fogos, que vai alterar toda a "envolvente". Os arquitectos preocupam-se muito com a envolvente dos outros e pouco com a envolvente dos projectos que eles assinam. E assim, contra os habitantes de Lisboa, Lisboa vai sendo assassinada por Valsassinas e quejandos, perdoe-se o trocadilho.
Deste mono tratarei mais tarde, quando regressar a Lisboa, já circulam petições. Inúteis, porque, adivinha-se, o projecto foi aprovado e existem as "expectativas" e etc. Faço mais perguntas, quem aprovou o mono do Rato em primeira instância, quem criou as tais expectativas, direitos adquiridos, etc.? Quem disse aos arquitectos e construtores e empresários, avancem, desenhem, projectem, está no papo, está aprovado? Quem quis assassinar o morto Largo do Rato? Certamente que não foi o PSD, agora tão enxofrado com o mono. E respondem-me que sim, que foi o PSD, exactamente, o PSD, o que estava na Câmara antes do Costa.
Deixa ver se eu percebo isto, embora os perceves estejam em extinção porque ninguém quer afrontar as escarpas para colher uns bichos feios como fungos e invulgarmente gostosos. Deixa ver se eu percebo e consigo fazer algum humor estival com a tragédia da nossa administração pública: O PSD deixou que os senhores que têm imensas expectativas e exigem milhões de contos de indemnizações se essas expectativas não forem satisfeitas chegassem a ter expectativas. E agora, o mesmo PSD vem exigir ao novo presidente da Câmara, o Costa, que contrarie as expectativas que eles mesmos criaram e aconchegaram. E a Câmara, falida por causa das dívidas do PSD, vê-se obrigada a satisfazer essas expectativas. O mono vai, portanto, com a suave bênção de arquitectos inteligentes que não entendem que o mono estaria muito bem em Chelas ou em Oeiras mas não está bem no coração de um bairro antigo e tradicional de Lisboa, ser construído.
É nestas alturas que eu tenho pena que a direita portuguesa não tenha um partido, um pensamento, uma posição conservadora, tradicional e absolutamente antiprogressista que apareça em situações destas e contrarie crimes destes e diga que os bairros antigos das cidades são para ser deixados em paz, reabilitados e mantidos longe das garras modernistas de arquitectos visionários que normalmente habitam bairros tradicionais, casas tradicionais, e jamais põem os pés como moradores e utilizadores nos monos que eles assinam. Gostam de paredes de pedra, vista para o rio, janelas de sacada e vidros com patine. Que faremos com este mono?
A sul, praia ao fundo, mostram-me um jornal com uma fotografia do mono, ou da maqueta do mono. E a notícia de que duas senhoras respeitáveis do PSD, de seus nomes Margarida Saavedra e Paula Teixeira da Cruz, estão muito incomodadas com o mono e pedem explicações ao actual presidente, o Costa, e ao Executivo municipal. Percebo, o que não é o mesmo que perceve, uma coisa que se come muito para estes lados, que o mono vai ser instalado algures entre o Palácio Palmela, a sinagoga de Lisboa e uma série de edifícios classificados, e que tem a assinatura dos arquitectos Valsassina e Aires Mateus, reputadíssimos. O mono é um monstro, parece uma prisão, é um monobloco brutal, totalmente desadequado no Largo do Rato, com uma altura calculada pela cércea da Alexandre Herculano e não da praça, o pobre Rato, e percebo que a petição era contra o monstro. Eu moro por ali e sou já contra o monstro, embora dois arquitectos reputados, Helena Roseta e Manuel Salgado, confessem uma certa simpatia pelo monstro. Não se ataca a corporação dos reputados arquitectos.
Faço uns telefonemas e pergunto, o mono vai mesmo ser aprovado? Segundo o jornal, o reputado "Público", só vão votar contra o mono o vereador Sá Fernandes e o PCP. O mono vai ser aprovado. E construído. Faço mais umas perguntas? Porquê? Porque há direitos adquiridos, expectativas dos construtores e promotores, e cancelar o mono significaria pagar indemnizações de milhões de euros que a Câmara não tem. Portanto, quando os moradores de Lisboa sabem de monos construídos na sua área de residência, sabem tarde demais e a conversa é esta: expectativas dos donos do projecto. Entre a Duarte Pacheco, as Amoreiras e a Artilharia Um, está prevista a construção de uma cidade dentro da cidade, outro mono monstruoso, com dezenas de milhares de fogos, que vai alterar toda a "envolvente". Os arquitectos preocupam-se muito com a envolvente dos outros e pouco com a envolvente dos projectos que eles assinam. E assim, contra os habitantes de Lisboa, Lisboa vai sendo assassinada por Valsassinas e quejandos, perdoe-se o trocadilho.
Deste mono tratarei mais tarde, quando regressar a Lisboa, já circulam petições. Inúteis, porque, adivinha-se, o projecto foi aprovado e existem as "expectativas" e etc. Faço mais perguntas, quem aprovou o mono do Rato em primeira instância, quem criou as tais expectativas, direitos adquiridos, etc.? Quem disse aos arquitectos e construtores e empresários, avancem, desenhem, projectem, está no papo, está aprovado? Quem quis assassinar o morto Largo do Rato? Certamente que não foi o PSD, agora tão enxofrado com o mono. E respondem-me que sim, que foi o PSD, exactamente, o PSD, o que estava na Câmara antes do Costa.
Deixa ver se eu percebo isto, embora os perceves estejam em extinção porque ninguém quer afrontar as escarpas para colher uns bichos feios como fungos e invulgarmente gostosos. Deixa ver se eu percebo e consigo fazer algum humor estival com a tragédia da nossa administração pública: O PSD deixou que os senhores que têm imensas expectativas e exigem milhões de contos de indemnizações se essas expectativas não forem satisfeitas chegassem a ter expectativas. E agora, o mesmo PSD vem exigir ao novo presidente da Câmara, o Costa, que contrarie as expectativas que eles mesmos criaram e aconchegaram. E a Câmara, falida por causa das dívidas do PSD, vê-se obrigada a satisfazer essas expectativas. O mono vai, portanto, com a suave bênção de arquitectos inteligentes que não entendem que o mono estaria muito bem em Chelas ou em Oeiras mas não está bem no coração de um bairro antigo e tradicional de Lisboa, ser construído.
É nestas alturas que eu tenho pena que a direita portuguesa não tenha um partido, um pensamento, uma posição conservadora, tradicional e absolutamente antiprogressista que apareça em situações destas e contrarie crimes destes e diga que os bairros antigos das cidades são para ser deixados em paz, reabilitados e mantidos longe das garras modernistas de arquitectos visionários que normalmente habitam bairros tradicionais, casas tradicionais, e jamais põem os pés como moradores e utilizadores nos monos que eles assinam. Gostam de paredes de pedra, vista para o rio, janelas de sacada e vidros com patine. Que faremos com este mono?
in "Expresso"
9 comentários:
a todos os títulos, um texto lamentável.
porque nada há aqui que "opinião", sem qualquer sustentação que não a prosápia e a arrogãncia desta senhora. o costume nela, portanto.
j
Meu caro colega
Começo por agradecer a sua intervenção neste blog com sua opinião, apesar da mesma ser sómente sobre Clara Ferreira Alves.
Não me competirá a mim a sua defesa, visto a dita sra ter a idade, que eu não sei mas, que presumo suficiente para se defender, se assim o entender.
Relativamente ao artigo em si mesmo, se bem que haja nele ideias subjacentes com as quais não concordo, no todo parece-me bastante significativo e pertinente; aponta as ideias e opiniões daqueles que, não sendo arquitectos, discordam deste projecto para aquele local.
Não penso que esteja vedado á opinião de quem não possui habilitações na disciplina de arquitectura, a livre e responsável opinião sobre intervenções e alterações efectuadas na malha urbana, que a todos nós dizem respeito, principalmente quando alteram a memória da cidade e dos locais das nossas vivências, parecendo-me pois totalmente pertinente, que emitam as suas opiniões.
Não são os decisores politícos tudo menos arquitectos e apesar disso,não são eles que, na maior parte dos casos, decidem quais os projectos adequados para os locais? Veja por exemplo,o caso do novo museu dos coches, decidido com base em que pressupostos e em que aspectos técnicos? Conhece algum?
Então aí o Mário Lino, só por ser ministro, já pode opinar com conhecimento de causa?
Não vou agora, argumentar técnicamente sobre o assunto, resguardando-me para a grande discussão que se avizinha; irei deixar os aspectos técnico-legais para essa altura e para sede própria, mas posso assegurar que, nem sob o ponto de vista da mera discussão legal e académica, este projecto é 100% sustentável...
De qualquer forma, são opiniões diferentes, mas que têm obrigatóriamente, que ser democráticamente respeitadas!
Cumprimentos.
Não acho o texto nada lamentável, pelo contrário!
A senhora é arrogante? Talvez seja, mas regra geral tem razão nas coisas que diz... Claro que em Portugal não estamos muito habituados a esta franqueza e a este estilo não subserviente...
Obrigado por aqui ter colocado artigos da Clara Ferreira Alves a par do Miguel Sousa Tavares como já aqui tem feito. Uma coisa é certa, ambos com cada vez mais "amigos" em Portugal!
Bem haja!
OK Carlos, bem hajas tu também e obrigado pela tua participação.
Conforme já deves saber foi indeferido o licenciamento da obra do "Edifício do Rato", com os votos contrários de toda a oposição. Claro está que, a batalha foi ganha mas a guerra ainda não, pelo que se avizinham novas lutas.
Eu, nestas coisas de Lisboa quero lá saber da politica, da direita e da esquerda e de outras querelas que servem só os interesses de quem nos tenta distrair daquilo que interessa: A minha cidade!
Abraço.
sobre o assunto que pende sobre as nossas cabeças deixei posta lá na minha tasca. não terei a mesma posição que a que defende, mas, e por isso mesmo, acho que é uma oportunidade de ir havendo um debate decente e civilizado - coisa que vai escasseando no nosso apertado espaço público.
confesso que comentei o texto da srª. alves dada a facilidade doutoral com que a senhora discorre um pouco sobre tudo e sobre o nada. uma arrogância típica das nossas peseudo-elites que, quando saem de lisboa ou é para ir ao estrangeiro - esse país mirífico - ou para ir ao algrave - onde conseguem sempre um "lugar maravilhoso afastado do caos e da fealdade" e do povo, direi eu. (em todo o caso, esta minha impaciência com a senhora não vem de agora, muito menos deste tema, e será, evidentemente, problema meu).
e acho óptimo que a arquitectura saia do armário da nossa academia. ou de nós mesmos.< que se discuta. vamos em frente.
cumprimentos,
j
"Quem disse aos arquitectos e construtores e empresários, avancem, desenhem, projectem, está no papo, está aprovado?"
Pois, pois....assim é, quase sempre. E seria para esta quinta coluna de políticos e funcionários públicos, que eu apontaria os meus canhões. São estas "figuras", que nos vão vendendo e destruindo a cidade. Podemos criticar os demais, mas....eles estão a actuar conforme as possibilidades que lhes são concedidas.
JA
Olá Júlio:
Se bem que neste caso concreto , há sobreposição de funções; um dos autores também é, ao que parece, promotor.
Mas claro que tens razão; os dirigentes politicos que desempenham papeis decisórios, fartam-se de clamar que estão de pés e mãos atadas por não terem modo de agir legalmente, contra este tipo de situações (apesar de, neste caso concreto, haver situações que podem ser refutadas por existirem desconformidades legais), mas nunca tomam a decisão politica efectiva de alterarem os instrumentos de planenamento...Porque será?
Ó Luís...sem estar muito a par da coisa: se o PDM existente fosse respeitado, este edifício estaria dentro das normas? Ou existem "instrumentos de planeamento", que são continuamente ignorados?
JA
Júlio, eu diria que há instrumentos de planeamento que são "interpretados" consoante o interesse para os casos específicos. Neste caso haverá o problema das cérceas em relação á envolvente: Alinha-se pela Alexandre Herculano ou pelo Salitre e pelo Rato? É por onde der mais jeito ao particolar? Ou a cércea deverá ser referida em relação a toda uma envolvência em que o edifício se deverá integrar?
E o RGEU, conforme referido pela arq Helena Roseta, respeita-se na totalidade ou não?...
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