quinta-feira, 24 de julho de 2008

LISBOA NO SEU MELHOR... Será possível a destruição da Escola-oficina nº1 ?


«A Escola Oficina nº 1 situa-se no Largo da Graça nº 58 em Lisboa. O local não tinha construção até aos anos setenta do século XIX, sendo então uma quinta murada. A 29 de Junho de 1876 foi fundada a Sociedade Promotora de Creches, estando ligados a ela nomes como José Rosa de Araújo ou António Dias Ferreira, homens da política nacional e da gestão camarária. Ainda em 1876 a Sociedade Promotora de Creches inaugurou a sua primeira creche no Largo do Outeirinho da Amendoeira, em S. Vicente de Fora. O edifício da Escola Oficina começou a ser construído em 1877, tendo o terreno sido cedido pela Câmara Municipal de Lisboa, sendo então Rosa Araújo o presidente da edilidade. O projecto foi elaborado e cedido gratuitamente pelo arquitecto Domingos Parente da Silva, também ele membro fundador, tendo para a construção do edifício sido necessário contrair um empréstimo de dez contos de réis, divididos em mil acções de dez mil réis cada uma e pagas em prestações mensais consecutivas de mil réis.O edifício, tal como o conhecemos hoje, ficou pronto em 1878. Para lá foi transferida a creche do Largo do Outeirinho da Amendoeira, passando a designar-se de Creche de Santa Eulália em homenagem à mãe de Rosa Araújo, e ali funcionou até 1903, altura em que as dificuldades económicas determinaram o aluguer à Provedoria do Asilo Municipal. A 26 de Abril de 1904 é realizada uma Assembleia Geral que aprova novos estatutos e altera a designação de Sociedade Promotora de Creches para Sociedade Promotora de Asilos, Creches e Escolas, sendo a sua sede instalada na Rua de S. João da Praça 83 - 2º, onde é inaugurada a Escola-Oficina nº 1 no dia 1 de Janeiro de 1905. Em 1906 a Escola-Oficina transfere-se para as suas antigas instalações no Largo da Graça, atingindo então projecção nacional e internacional em matéria de ensino, com um projecto de ensino por muitos considerado bastante avançado para o seu tempo, baseado numa escolaridade laica, gratuita e obrigatória.Iniciativa das Lojas maçónicas Sementeira e José Estevão, ligadas ao Grande Oriente Lusitano, tinha por objectivo dotar a sociedade de bons profissionais sendo preferencialmente destinada às crianças do bairro da Graça. É também um curioso exemplo de colaboração entre maçons e anarquistas portugueses, ainda que enquanto entidade tivesse sempre estado na esfera de influência da Maçonaria portuguesa. O ensino ali praticado privilegiava além de um plano curricular dividido entre a teoria e a prática oficinal, a relação adulto-criança, sendo também marcantes as inovadoras formas de avaliação. O primeiro plano de estudos data de 1904, elaborado antes da inauguração, contando com o ensino do português e da aritmética, da escultura em madeira, do desenho e da marcenaria. Em 1907 possuía já uma educação geral primária com disciplinas como Francês, Ginástica, Física, Química, Botânica, Zoologia, Higiene, Aritmética, Sociologia e, naturalmente, o Português. Quanto à parte oficinal era composta pelo desenho, construção de mobiliário e talha. A Escola inseria-se na vivência social e política do bairro da Graça, um bairro essencialmente operário onde coexistiam republicanos, socialistas, anarquistas, carbonários e maçons, muitos deles pertencendo cumulativamente a mais do que uma organização.É ainda de sublinhar o carácter “enciclopédico” do ensino ministrado, designado então de “educação integral”, como que preparando o aluno para a abordagem de vários assuntos teóricos ou várias actividades práticas, numa semelhança com a prática maçónica. É neste contexto, e a propósito do curriculum, que merece referência a atenção dada à preservação e ao contacto com a natureza, onde por influência maçónica foi introduzida a comemoração do Dia da Árvore, que coincide com o equinócio da primavera comemorado na Maçonaria. De referir ainda que a escola era gratuita e suportada pela Maçonaria através das Lojas ou pelas contas do próprio Grande Oriente Lusitano, o que era extensível ao material didáctico necessário ou à existência de uma biblioteca própria.»
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por António Lopes in site do GOL
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É pois com pesar que se vê património histórico-cultural, que teve um papel pioneiro num dos métodos do ensino em Portugal, poder vir a ser destruído por questões meramente especulativas isto, independentemente das opções políticas, associativas ou religiosas de cada um e que não são para aqui chamadas ...

6 comentários:

com senso disse...

Mais do que a ignorância, o que me impressiona é a falta de AMOR dos autarcas pela sua cidade.
Não gostam de Lisboa como ela é... querem uma Lisboa diferente...
Acho este tipo de gestão autárquica uma verdadeira ursupação de poder... Não foi para isto que foram eleitos...
Obrigado por este magnifico post

Carlos Veiga disse...

Um texto muito interessante!
Realmente é uma pena a delapidação histórico-cultural nesta cidade, aliás, no país em geral...

Arq. Luís Marques da silva disse...

A destruição deste tipo de património, que possui em si mesmo uma carga politíca, social, ideológica e histórica tão grandes, deve ser impedido; a sua salvaguarda é imperiosa, independentemente das convicções politícas e religiosas de cada um.
São marcos da arquitectura que servem para escrever a nossa história. Destruí-los é apagar as memórias do nosso passado.

Anónimo disse...

Eu penso que a questão não terá um fundo ideológico assim tão grande...
Penso que é mesmo uma questão de sensibilidade histórica, cultural e sobretudo de alguns interesses instalados independentemente da sua orientação política!

Arq. Luís Marques da silva disse...

Caro anónimo
Quando falo em carga ideológica, refiro-me á intimidade existente entre, a criação deste modelo escolar e algum pensamento anarco-socialista da 1ª república.
É por isso que entendo que, mais do que a excepcional qualidade do edifício, o que lhe está mais intrìnseco e por isso, o mais imperioso de defender dos ataques demolidores, é a sua simbologia.
Concorda?

Anónimo disse...

Nessa perspectiva, sem dúvida que concordo!