terça-feira, 17 de junho de 2008

"VIAGENS NA MINHA TERRA...": CABO ESPICHEL - Santuário de N Sra da Pedra Mua


fig 1. vista do conjunto do lado do mar



fig 2. a casa da água


fig 3. vista da casa da água para o santuário


fig 4. Igreja de N Sra do Cabo




fig 5. vista do terreiro



fig 6. colunata das lojas das casas dos círios



fig7. vista do terreiro, vendo-se o cruzeiro em primeiro plano e a igreja ao fundo



Conta a lenda que, no sec XIII, um homem terá visto Nossa Senhora vindo do mar, montada numa mula que deixou, marcadas na rocha, as suas pegadas.
Tais pegadas, ainda hoje existentes, correspondem a trilhos fossilizados de dinossauros do Jurássico...

Foi no início do sec XV que foi erigida, no cimo da Pedra da Mua, uma eremida destinada a guardar a imagem da Virgem, á muito venerada e destinada á protecção dos mareantes.
Das construções, que á volta da eremida foram nascendo e destinadas a acolher os peregrinos, nasceram, após uma profunda reformulação datada de 1715, as hospedarias. São construções de sobrado e loja e que se passaram a designar por casas dos círios, nome retirado dos círios ou grandes grupos de peregrinos. Conforme se pode ler numa lápide evocativa, situada á porta da igreja, foi ao designado círio saloio, constituído por gentes provenientes da zona dos arredores da capital, que se deveu a sua construção: "Casas de N. Sra de Cabo feitas por conta do círio dos saloios no anno de 1757, para acomodação dos mordomos que vierem dar bodo".

O santuário de Santa Maria da Pedra de Mua sempre foi muito venerado registando uma grande afluência de peregrinos, mas é no sec XVIII que ganha a sua maior projecção, com a assidua presença da família real e da corte. O giro de N. Sra do Cabo passou então a integrar uma imagem peregrina, transportada em berlindas processionais e que se podem ainda hoje admirar no Museu Nacional dos Coches.

Do conjunto arquitectónico do santuário, fazem parte a Igreja de N. Sra do Cabo, construção do sec XVIII, virada para terra, de costas para o mar e que possui no seu interior um valioso conjunto, recentemente restaurado, de pinturas, ex-votos e a antiga imagem de N Sra, protegida por maquineta, posta no trono do retábulo; as casas dos círios, já atrás referidas e que formam o terreiro, local onde se situa o cruzeiro e onde começa vedadeiramente o santuário; a ermida da memória, situada a Noroeste da igreja, trata-se de uma pequena capela, de planta quadrangular e cobertura de abóboda, formando arco de volta e contra-volta, ao gosto árabe e possuindo, no seu interior, paineis de azulejos azuis e brancos; junto ás casas dos círios, fica a casa da ópera, edificada em 1770 e destinada a promover espectáculos para os peregrinos, tendo sido utilizado várias vezes pela família real, aquando da sua permanência nas festividades; a casa da água, construída em 1770, construção de planta hexagonal, cobertura em cúpula também hexagonal, rematada por lanternim, possuindo simalha envolvente, pilastras nos cunhais por forma a marcar as seis faces e, no seu interior possui uma bela fonte "rocaille" em mármore, com elementos escultóricos, bancos de pedra ao longo das paredes e, para revestimento destas, restos de um silhar de azulejos da fábrica de Belém, com cenas alusivas aos círios e a cenas de caça e por fim e ainda fazendo parte do conjunto arquitectónico, surge o aqueduto que abastecia o santuário e que se estende por dois kilómetros, desde a Azóia até á casa da água.



Bem, esta é muito sucintamente a história côr de rosa, deste magnífico conjunto arquitectónico religioso cuja posse é partilhada pela Igreja e pelo estado português, numa comunhão que foi iniciada com a doação de uma das alas das casas dos círios, pela primeira ao segundo, com a condição do segundo proceder ao restauro e requalificação de todo o santuário.
Mas neste país em que as palavras são levadas pelo vento e onde agora até os acordos voam não se sabe para onde, álguem acredita que este acordo foi cumprido?

Apesar da sua magnífica localização geográfica e com capacidades de excepcional valor turístico, este santuário está á décadas, a cair de pôdre, num completo abandono infâme e ultrajante á memória daqueles que, com o suor do seu trabalho àrduo e explorado, contribuíram desinteressada e generosamente para a sua construção.

Tirando o restauro da igreja de N Sra do Cabo, nada mais recebeu um reparo que seja para a consolidação do património; últimamente a C.M.Sezimbra, resolveu despejar no terreiro, umas toneladas de gravilha para dar um ar mais "limpinho" e melhorar o aspecto daquela esterqueira. Não se lembraram porém das necessidades nem do sexo feminino, com os seus inopurtunos saltos nem daqueles que possuindo, de alguma forma, mobilidade reduzida, se vêm aflitos para atravessarem aquele espaço sem se enterram na gravilha, não se conseguindo movimentar com a necessária facilidade, legalmente decretada e a que as câmaras estão obrigadas a obedecer, prevendo nas suas intervenções, as necessárias disposições.

Mas não fica por aqui a desgraçada existência do santuário de Santa Maria da Pedra Mua. Há mais e muito mais; a electricidade, tão necessário á iluminação daquele espaço, até como forma de protecção nocturna e necessária também para manter ligados desumidificadores, no interior da Igreja recentemente restaurada e sujeita constantemente á marzia, é fornecida por um gerador, abastecido semanalmente pela câmara municipal.
O saque dos azulejos do silhar do interior da casa da água e provenientes da antiquissíma fábrica de Belém, é uma vergonhosa evidência, que difícilmente será possível repôr; até o lanternim está partido: Ao aqueduto faltam bocados; ás casas dos círios, destruídas, acimentadas e onde reinam as fezes, os grafitis e o lixo, falta-lhes um projecto de requalificação e consequentes obras de reabilitação.

Alguém me poderá explicar a razão de não estar aquele espaço fabuloso já dedicado a um local misto de culto e de turismo, com uma pousada de charme a funcionar em moldes especificos, de forma a dignificar e respeitar o culto local mas e ao mesmo tempo, adquirindo um dinamismo e as condições necessárias a tão belo espólio?

São estes os indícios da nossa cultura cada vez mais e sómente rendida aos encantos do futebol e das revistas côr de rosa, deixando cair de forma inglória o nosso património. A preocupação com inaugurações festivaleiras de qualidade abaixo do medíocre, onde se esbanjam os dinheiros públicos de forma desregrada:
Depois de assistir a este degredo patrimonial, qual não foi o meu espanto quando, ao passar numa rotunda em Santana, lá estavam uns tristes ilustres, acompanhados de meia dúzia de gatos pingados a inaugurar uma... "estátua"... que deve ter custado para cima de um dinheirão!!!

1 comentário:

Anónimo disse...

"Alguém me poderá explicar a razão de não estar aquele espaço fabuloso já dedicado a um local misto de culto e de turismo..."

Vamos imaginar este espaço em Itália, França, Inglaterra...
Somos mesmo uma vergonha para os nossos antepassados. Bolas !!!!

JA